A teoria do cérebro trino foi criada na década de 70 pelo médico americano MacLean. Esta teoria consiste, em linhas gerais, que não possuímos apenas 1 cérebro, mas três estruturas cerebrais com funções específicas. Estas estruturas ou formações anatômicas que constituiem o cérebro trino são o R-Complex (Cérebro reptiliano), o Sistema Límbico (Cérebro emocional) e o Neocórtex (Cérebro Racional). Cada cérebro se desenvolveu em épocas distintas, estando diretamente relacionado com as necessidades de cada época evolutiva.
Mas, quais seriam as funções de cada estrutura cerebral e por quais comportamentos estas seriam responsáveis? Até que ponto estas estruturas não somente influenciariam, mas “comandariam” nossos comportamentos cotidianos? Poderíamos ter o livre arbítrio no comando destas estruturas e seus comportamentos inerentes?
Não levando em conta as características de personalidade e da cultura em que cada pessoa está inserida, psiconeurofisiologicamente as pessoas geralmente não têm noção exata porque se comportam de tal maneira, porque tomam determinadas decisões precipitadas ou porque agem com impulsividade ou medo exacerbado em determinadas circunstâncias.
Você saberia explicar porque ficamos “cegos de raiva” e depois nos arrependemos da forma como reagimos? Você acredita que todas as suas decisões são realmente racionais? Você saberia explicar além das elucidações idiossincráticas e culturais porque as mulheres são mais emotivas?
Gostaria de deixar bem claro que estas informações que serão colocadas aqui não terão o intuito de legitimar nenhum comportamento que não é admissível em sociedade; muito pelo contrário. Este esclarecimento é exatamente para que tomemos consciência e reflitamos como se processam nossas reações e emoções a nível cerebral e como estas influenciam em nossos comportamentos, a fim de trabalhá-las, objetivando baixar o índice de violência e agressividade em geral.
No aspecto relacional, objetiva compreender e trabalhar comportamentos de impulsividade, tais como decisões precipitadas que possam arruinar a autoimagem ou de outrem, bem como destruir relacionamentos que poderiam ser pacíficos e duradouros. Por outras palavras, melhorar a convivência em sociedade através da conscientização e do autoconhecimento tendo como premissa a conservação do nosso bem maior: a vida.
Vamos conhecer cada uma destas estruturas e por quais comportamentos são responsáveis:
1- R- Complex:
Também conhecido como cérebro reptiliano, é o responsável por nossos instintos de sobrevivência, funções vitais, conservação, defesa e reprodução da espécie. Também é responsável pelos 5 sentidos, musculatura lisa, pressão sanguínea, arcos reflexos, a sensação de fome e saciedade, a salivação, os processos digestivos, o sono, a necessidade de sexo, a respiração, a manutenção dos batimentos cardíacos, o espirro, bem como pela manutenção da homeostase ou equilíbrio do organismo como um todo. Aqui não temos o comando, pois não decidimos acerca dos nossos batimentos cardíacos, respiração ou processos digestivos que estão no comando do sistema neurovegetativo.
É no cérebro reptiliano que o medo está predominantemente instalado e vivenciado, atuando nos mecanismos filogenéticos de luta e fuga. Todos estes instintos se encontram também nos répteis. Anatomicamente, o cérebro reptiliano é formado pela medula espinhal e pelo tronco encefálico.
Situações cotidianas:
Esta estrutura cerebral está relacionada aos comportamentos de territorialidade, necessidade de poder, competição e dominação. Em outras palavras, no cérebro reptiliano, os outros e o ambiente em dadas circunstâncias são percebidos e interpretados como ameaçadores, provocando reatividade como a agressão.
Sendo assim, você reconhece estes comportamentos em nossa sociedade atual? Na sua opinião, até que ponto de fato evoluímos? Somos de fato tão racionais assim?
2- Sistema Límbico:
Também conhecido por cérebro emocional, é responsável por respostas emocionais e sua regulação, bem como por experiências sensoriais, sonhos, aprendizado, imaginação e memória. Uma estrutura muito importante que compõe o Sistema Límbico é a amígdala cerebral, estando diretamente relacionada ao controle dos impulsos. No conhecido “seqüestro da amígdala”, é a emoção que comanda o cérebro. Neste momento, a pessoa “sai de si”, a “vista escurece”, a pessoa fica “cega de raiva”, reage desproporcionalmente ao fator desencadeante de estresse, fala o que não deveria falar e faz algo que certamente se arrependerá amargamente. Isto porque o Neocórtex, o qual irei falar no tópico a seguir, não participa deste processo e conseqüentemente não ocorre nenhuma racionalização do ato naquele momento específico, pois as emoções de reatividade e agressividade estão no comando, à “flor da pele”.
3- Cérebro Racional:
Também conhecido como Neocortex, evolutivamente é o cérebro mais recente, a última camada ou estrutura que recobre os outros dois cérebros. O Neocortex é diferenciado nos mamíferos e primatas, apresentando sulcos, fissuras e giros. Está diretamente relacionado ao desenvolvimento da linguagem, ao pensamento abstrato, aos movimentos voluntários, habilidades motoras e funções executivas como raciocínio, resolução de problemas, planejamentos e conclusões lógicas.
Aprendendo a gerenciar as emoções:
É impossível controlar as emoções, como escutamos recorrentemente. Contudo, você pode sim e deve aprender a gerenciá-las, administrá-las e conseqüentemente mudar sua conduta em um momento de muita raiva e estresse negativo. Isto não é somente possível, mas necessário. Sendo assim, quando sentir que está “saindo de si”, aprenda a ativar o córtex pré-frontal, parte integrante do Neocórtex que é responsável pelo seu “juízo”, pela avaliação racional do evento estressor. Durante o “seqüestro da amígdala”, esta parte racional está bloqueada, necessitando ser ativada para que as ações não sejam regidas somente pelo “calor das emoções”.
Existem muitas técnicas para que num possível seqüestro da amígdala, você não estrague a sua vida ou de outras pessoas. Explicarei melhor sobre estas técnicas em um outro momento, mas colocarei aqui duas bastante simples, mas que funcionam: a respiração profunda, a resolução de um pequeno cálculo matemático ou fazer algum planejamento são dicas que podem fazer a diferença em um momento de muita raiva. O contar até 10, embora muito simples, oferece um espaço de tempo para a ativação de áreas cerebrais responsáveis pela racionalidade. Em outras palavras, a estratégia fundamental para não “perder a cabeça” naquele momento estressor é a mudança de foco, enquanto você ganha tempo para ativar outras regiões do cérebro responsáveis por um olhar mais racional daquela situação e suas conseqüências.
No entanto, caso você seja uma pessoa excessivamente impulsiva, é necessário fazer uma avaliação profissional e realizar treinos com técnicas específicas. Entenda que problemas, desafios, diferenças ou resolução de conflitos nunca serão solucionados no “calor das emoções”. Portanto, é imprescindível desenvolver a inteligência emocional e o gerenciamento de suas emoções.
Reitero que a forma como reagimos emocionalmente irá repercutir de maneira positiva ou negativa em nossa qualidade de vida e por uma sociedade mais saudável também. E você já sabe, como, porque e em quais circunstâncias precisa fazê-lo.
Autora
Soraya Rodrigues de Aragão
Psicóloga, Psicotraumatologista, Expert em Medicina Psicossomática e Psicologia da Saúde. Autora em 4 livros publicados. Escritora em vários portais, jornais e revistas no Brasil e exterior.
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