Paz, em seu aspecto descritivo, é um estado de espirito pleno, onde há ausência de conflitos ou perturbações e por isso a comparo a um cristal em meio as tribulações da vida, em que se precisa ter muita atenção e cuidado para que não se rompa. Mas, essa paz interior contínua, imperturbável e inquebrantável acontece de fato na vida prática? Seria possível cultivá-la mesmo em um mundo que quando termina um desafio, logo inicia um outro?
Como tudo nessa vida é dual e complementar, o mundo em que vivemos também apresenta seu lado sombra, seu lado hostil, onde infelizmente ainda predominam a avidez, a ganancia, a competição, o territorialismo, a falta de perdão, os desafios diários e a falta de conexão empática entre as pessoas para que juntas possam reunir forças no intuito de superar os desafios que essa existência nos apresenta.
Por esse motivo, cultivar a paz interior é sobretudo um posicionamento, uma escolha que precisa ser feita de modo consciente com suas implicações, requerendo autoconhecimento e treino diário para que se possa colher os seus benefícios. A palavra cultivar implica exatamente em trabalharmos os aspectos necessários para vigiarmos e zelarmos com afinco o terreno para que seja frutífero, dedicando-nos com paciência, treino e consciência ampliada.
Cultivar a paz é tão importante quanto o ar que respiramos, visto que em nosso cotidiano acontece de tudo um pouco, desde pequenos aborrecimentos, até desafios mais sofisticados e que nos requer fortaleza interior para não nos desestruturarmos com qualquer intempérie.
Um novo posicionamento diante da vida em defesa de sua paz interior
A paz não pode ser romantizada, idealizada, pois não existe paz inabalável pelo simples fato de que vivemos em um mundo onde tudo flui, se transforma, se transmuta. Tudo está nascendo e morrendo, indo e vindo em uma constante complexidade de opostos que mantém a vida. Para contextualizar esse aspecto te convido a se observar no decorrer das próximas 24h, de como seu funcionamento muda, incluindo estratégias para lidar com as circunstâncias e pessoas. Tudo o que vive está nessa dinâmica de altos e baixos, de alternância, de impermanência. Aquilo que é permanente neste mundo não tem mais vida, segue somente uma linha sempre reta e continua como o aparelho da UTI, o monitor multiparamétrico que assinala que a morte venceu e que não há nada mais que possa ser feito. O desafio é que estamos tão habituados aos barulhos, a um mundo de conflitos, que nos concedermos a permissao de sentir a paz muitas vezes nos parece algo estranho ou mesmo distante de nós. E para o cultivo da paz, é preciso um novo posicionamento diante da vida, o estabelecimento, de uma nova orientação diante dos fatos e do estabelecimento de limites importantes.
Foto de Alexandr Podvalny no Pexels
Paz e relacionamentos
Qualquer relacionamento que ponha em jogo sua paz não vale a pena ser investido, pois uma das coisas mais importantes da vida é estar com o coração tranqüilo, é entardecer com equilíbrio, é chegar a noite e dormir o sono dos justos, é se levantar pela manhã sem sobressaltos e desesperos. Há pessoas que carregam tanta tralha emocional nas costas, que se torna impossível sentir a leveza da vida. Isso porque paz sempre tem uma pitada de desapego. O problema é que as pessoas compreendem que desapego é sinônimo de fracasso e ninguém quer se dar por vencido. Não há nada de errado em se desapegar do que nos causa infortúnio. Deixar ir seria sinônimo de falta de luta, de fracasso, de covardia? Será? E porque continuar investindo em relacionamentos inseguros, inflexíveis, abusivos, não correspondidos?
Perceba, que muitas vezes somos nós que tiramos o nosso próprio sossego, que contribuímos para a desorganização da própria vida. Portanto, se dê um pouco de paz, pare de se cobrar tanto, não permita que o outro também faça cobranças indevidas. Onde nao hà paz, há sempre de sobra inflexibilidade, sofrimento e desamparo.
Paz e pessoas
Pessoas que tiram a nossa paz? Sabemos porque isso acontece. Por que em algum momento fomos permissivos ou invigilantes. Nessa vida precisamos ser suficientemente perspicazes para não adentrarmos em searas ou situações que nos infelicitam ou de outro modo seremos engolidos por circunstâncias dolorosas. E sim, algumas pessoas podem ser suficientemente egoístas para não se colocar em nenhum momento no seu lugar, para procurar entender como você se sente ou mesmo agir como você agiria na mesma circunstância. Para algumas pessoas e na maioria delas ainda vale o “salve-se quem puder”, “Os fins justificam os meios (Maquiavel) ” ou o “Deus por todos e cada um que se vire (ditado popular)”.
Simplifico tudo que escrevi até entao em apenas três frases: Não abra mão da sua paz por nada nesse mundo, se desapegue do que não acrescenta, do que prejudica, do que traz sofrimento. A sua paz vale mais que ouro, é seu bem mais precioso, algo totalmente inegociável. Portanto, por todos os argumentos possíveis, coloque seu coração em paz, se dê paz, pare de se torturar e tampouco permita que os outros o façam. Estabeleça regras para sua vida, concorde limites em seus relacionamentos.
Autora
Soraya Rodrigues de Aragão
Psicóloga, Psicotraumatologista, Expert em Medicina Psicossomática e Psicologia da Saúde. Autora em 4 livros publicados. Escritora em vários portais, jornais e revistas no Brasil e exterior.
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