Do que é necessário nos desapegarmos para reconfigurarmos nossa existência? O que seria preciso transmutar para sentirmos a libertadora leveza da vida? Uma das respostas é que precisamos renunciar: a antigas batalhas e velhas couraças de guerra, a arcaicas querelas, aos rompimentos da vida, do fio do “destino” que estamos traçando com as próprias mãos e que podem ser estruturas danosas. Queremos brindar a vida e que esta se renove. Queremos ter novas chances e perspectivas, mas na maioria das vezes continuamos olhando pelo retrovisor, atados às correntes do controle do incontrolável, da vitimização e da culpabilização (de si ou dos outros).

Precisamos compreender que o que fez parte da nossa história não são travas e que podemos, muitas vezes, quando quisermos, termos o controle das nossas vidas para empreender novos percursos. Na maioria das vezes, a desistência é percebida como fracasso, o que na verdade pode ser um movimento libertador. Em muitos casos, seria interessante aceitar que a lareira apagou, que a árvore “esqueceu de dar flores”, que o tempo de aprendizagem daquela situação chegou ao fim para levar consigo o melhor do que foi em si. Precisamos fazer um brinde à vida, ao que se foi e ao que virá, mas com leveza, sem bloqueios, sem correntes.

Brindar à vida diz respeito sobretudo à soltura de todas as circunstancias que fizeram parte da nossa vida, porque se em algum tempo elas fizeram sentido e parte de processos de crescimento e aprendizado, mas agora podem inclusive se converter em empecilho do que poderia já estar em andamento. O problema é que nos habituamos até com o que nos faz mal e não queremos nos desapegar de coisas e pessoas porque acreditamos que não sobreviveríamos sem elas, como se as mesmas fossem uma extensão nossa. E vamos partir do pressuposto que de fato isso fosse verdade, como seria pesado levar nas costas todas essas amarras. Precisamos estar livres de correntes para levantarmos as mãos para o alto em um brinde à vida.

Foto de cottonbro studio no Pexels

E’ preciso que os ciclos se fechem dentro de nós, pois a partir deste ponto, olhamos o passado sem dor, sem vontade de voltar para checar se ali ainda há algo a se viver, já que não existem mais amarras na alma, sendo reconhecido que tudo que se foi vivido fez parte da construção do que somos, mas que sim, fins são necessários. O importante é percebermos que nós não somos a nossa experiencia, embora façamos parte desta. A partir dai, as coisas passam a ter uma nova perspectiva, mesmo graciosidade.

Sempre é tempo de mudança. Portanto, mude para melhor. Mude de postura, de comportamento, de crenças disfuncionais, de padrões negativos, do que não leva a nada, pois a vida pede progresso, evolução, renovação e muitas vezes, em sua ambivalência, a vida traz o melhoramento em troca de algumas renuncias. Mais uma vez reitero que o preço da coragem é a libertação. Muitas pessoas acreditam que ainda estão amarradas, vinculadas a algo, mas na realidade somente suas mãos estão atadas por conta própria. Muitas questões a serem resolvidas tantas vezes é somente com elas mesmas e não mais com os outros ou as circunstâncias.

Portanto, brindemos uma e mais tantas outras vezes para as diversas coisas maravilhosas que estão somente aguardando uma postura de renúncia e leveza para chegarem. E para isso, precisamos nos desvencilharmos de nossas amarras, porque nenhum brinde poderá ser feito por mãos acorrentadas.

Autora
Soraya Rodrigues de Aragão
Psicóloga, Psicotraumatologista, Expert em Medicina Psicossomática e Psicologia da Saúde. Autora em 4 livros publicados. Escritora em vários portais, jornais e revistas no Brasil e exterior.

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