Para compreendermos o que é a Alexitimia, é importante entendermos um pouco sobre o nosso mundo emocional. As emoções são nossas “companheiras inseparáveis”, exercendo papel importantíssimo para o processo de autoconhecimento, autodesenvolvimento e participando das nossas relações interpessoais. Somos seres emocionais e portanto ao nascermos trazemos uma pequena bagagem de 4 emoções inatas, as chamadas emoções primárias, que são: alegria, raiva, medo e tristeza. Alguns autores também acrescentam nesta categoria o nojo ou aversão e a surpresa. Com o processo do desenvolvimento, deverão ser desenvolvidas as emoções secundárias ou sociais em nosso repertorio emocional. Estas são mais complexas, não são inatas e portanto somente são aprendidas através da relação com pessoas, no meio social e que são: constrangimento, culpa, ciúme, desprezo, prazer, simpatia, complacência, vergonha e entusiasmo. As emoções secundárias são a combinação das emoções inatas elencadas acima. Sendo assim, a nomeação de emoções e sentimentos é sempre um processo de aprendizado que é realizado no meio social inicialmente através dos nossos cuidadores primários e posteriormente em nossas relações sociais. Quando estas relações são empobrecidas afetivamente, ocorre um igual empobrecimento em nomear, saber o que sentimos e como lidar com estas emoções, podendo surgir a Alexitimia.
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Etimologicamente, a Alexitimia, provém do grego, onde “A” significa negação, “Léxis” significa palavra e “timia”, emoção. Em outras palavras, a Alexitimia é a expressão de um modo de funcionamento neuropsicológico inadaptado, tendo como premissa a dificuldade em nomear, identificar, expressar e descrever as próprias emoções e sensações corporais. Pessoas com Alexitimia confundem sentimentos com sensações corporais, apresentando, portanto, dificuldades na regulação emocional. São pessoas que sabem descrever bem os eventos externos concretos, mas sente dificuldade na descrição de suas emoções, sentimentos e sensações, bem como das pessoas à sua volta. Trata-se de uma espécie de “embotamento emocional” para sentir, compreender e captar as emoções. Uma pessoa com Alexitimia tem dificuldade em demonstrar sentimentos, embora os sintam e os confundam com sensações corporais. Por exemplo, ao invés de reconhecer que sentiu raiva em um determinado evento, uma pessoa com Alexitimia não descreve sua raiva, mas sim dor no estômago, dor de cabeça ou tensão muscular, por exemplo. Veja bem, aqui não há um reconhecimento de sensações corporais, pois embora uma pessoa com Alexitimia se queixe de dores corporais como dor muscular, por exemplo, esta pessoa tem dificuldade em associá-la com emoções sentidas. Como a pessoa não consegue descrever, nem associar suas emoções em palavras através de um discurso afetivo contextualizado, a linguagem é expressa através de problemas psicossomáticos.
Prevalência
A Alexitimia é mais prevalente em homens que mulheres. Estima-se que aproximadamente de 10 a 20% da população mundial sejam alexitimicas.
Alexitimia Primaria e Alexitimia Secundária:
A Alexitimia primária ou crônica acontece desde a infância e no processo de formação da personalidade, sendo este tipo de funcionamento internalizado como traço de personalidade.
A Alexitimia secundária ou situacional é aquela em que acontecimentos foram geradores de um alto nível de estresse, provocando inclusive um trauma. Por este motivo, a Alexitimia situacional está relacionada ao Transtorno de Estresse Pós Traumático (TEPT).
Alexitimia primaria e secundária tem tratamentos diferenciados.
Saiba o que é o Transtorno de Estresse Pós Traumático aqui: TEPT
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Características da Alexitimia
1- Dificuldade em demonstrar empatia:
Quando me refiro a esta dificuldade específica, não estou em nenhum momento dizendo que na Alexitimia, as pessoas não sentem remorso, dor ou pesar. Elas não são pessoas que causam danos a terceiros. Esta dificuldade em se colocar no lugar do outro depende do grau da Alexitimia e sempre está associado a dificuldades que as pessoas têm em descrever e lidar com as próprias emoções e sentimentos e conseqüentemente esta “leitura emocional” estará igualmente prejudicada na leitura das emoções e sentimentos dos outros. Veja bem, se uma pessoa não consegue entender as próprias emoções, ela também não terá uma boa compreensão das emoções dos outros. Por este motivo, são percebidas como pessoas frias, calculadoras, distantes e indiferentes.
2- Criatividade, fantasia, imaginação e representação simbólica estão comprometidos:
Pessoas com Alexitimia, principalmente aquelas na modalidade crônica, sofreram, em algum nível em seu processo evolutivo de invalidação infantil dos seus estados emocionais, onde não foram atendidas suas necessidades afetivas e de cuidados relacionados a estados emocionais como raiva, tristeza ou medo, por exemplo. Um exemplo clássico disto: criança cai e chora, rala o joelho, mas alguns cuidadores podem não validar o que está acontecendo com a criança dizendo por exemplo: “Deixa de ser fraco, para de chorar, não foi nada”. Caso seja um menino, por aspectos culturais a questão fica ainda mais delicada: “homem não chora”, “engula esse choro”, “olha, as outras pessoas estão vendo que você está chorando, não demonstre fraqueza”.
A não legitimação das emoções durante o processo evolutivo infantil é um preditivo para a Alexitimia, já que a criança está em formação da sua personalidade. Pais: legitimem as emoções dos seus filhos, procure saber o que se passa com seu filho, tente entender o que está acontecendo, valide suas emoções. Caso perceba que estas emoções são exageradas para o contexto, procure ajuda profissional.
3- Representação simbólica empobrecida:
Tem dificuldade em abstrair, compreender e captar uma ironia subjacente a algo dito ou feito. Estão muito no concreto, no pragmático, no real. Pessoas com Alexitimia relatam que não se emocionam com livros ou filmes em que as outras pessoas choram ou riem e não compreendem porque elas se comportam de maneira tão emotiva. Também se queixam de não conseguirem captar a malicia nas pessoas próximas e os “falsos amigos”.
4- Dificuldade em suas relações interpessoais:
As relações são prejudicadas por conta do déficit da comunicação, do diálogo, da empatia e da dificuldade na compreensão das emoções alheias, seja por meio da expressão facial ou de gestos, bem como da antecipação destas mesmas emoções. Nos relacionamentos afetivo-conjugais, freqüentemente se queixam de baixa na libido ou baixo desejo sexual.
5- Dificuldade ou incapacidade em manejar emoções adequadamente:
Importante reler o item 1, pois parte do mesmo principio. Explicando melhor, o manejo emocional somente poderá acontecer caso a pessoa reconheça e compreenda suas emoções. Sem este substrato, não haverá manejo e regulação emocional. Conseqüentemente, estas emoções se materializam na via do físico através da somatização. Por este motivo, existe muita associação entre Alexitimia e doenças psicossomáticas.
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Causas:
As causas ainda não estão completamente esclarecidas e suas explicações não entram em consenso pelos profissionais. Alguns teóricos explicam por uma predisposição genética, influências socioculturais e familiares, enquanto outros explicam ser um traço de personalidade, trauma cerebral ou mesmo resultado de um trauma psicológico, ocasionando, assim, o Transtorno de Estresse Pós Traumático (TEPT). Resumindo: Para explicar da melhor forma as causas da Alexitimia, precisamos considerar a associação entre fatores genéticos e ambientais, incluindo traumas psicológicos. Neuropsicofisiologicamente, a Alexitimia está relacionada com uma disfuncionalidade no hemisfério direito do cérebro, responsável pelas emoções.
Psicoterapia:
O tratamento psicoterápico é de fundamental importância na Alexitimia. Na psicoterapia, trabalhamos de modo geral:
1- Técnicas de regulação emocional;
2- Treino de habilidades socioemocionais;
3- Treino para o desenvolvimento da inteligência emocional;
4- Ressignificaçao de traumas emocionais;
5- Outras técnicas, dependendo da demanda personalizada de cada paciente;
Além da psicoterapia, também são importantes:
1- Ver filmes e ler livros que estimulem as emoções:
2- Técnicas de relaxamento;
Autora
Soraya Rodrigues de Aragão
Psicóloga, Psicotraumatologista, Expert em Medicina Psicossomática e Psicologia da Saúde. Autora em 4 livros publicados. Escritora em vários portais, jornais e revistas no Brasil e exterior.
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